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sábado, 6 de fevereiro de 2010

Anda tudo doido

Aqui fica o editorial do "i" deste fim-de-semana, assinado por Martim Avillez Figueiredo e que no fundo retrata aquilo que infelizmente é hoje a sociedade, a política e as ditas "elites" portuguesas neste momento crucial para o país. É triste, mas por mais que não queiramos ver, a «doidice» já andou mais longe destas paragens!

"Os deuses devem estar loucos"

Um país define-se por aquilo que as suas gentes são capazes de fazer em momentos de crise. Mas as massas e as elites estão a falhar nessa matéria

Quem comprar um jornal grego por estes dias pode decifrar melhor aquele impenetrável alfabeto do que entender o que se passa em Portugal. O país está louco? A resposta, na verdade, é o que menos interessa - basta que uma pergunta como esta seja possível para que se ponham em causa as fundações de um país. Não vale a pena fingir-se perplexo - isso já de nada vale contra a impunidade de uns quantos. O que permite um raciocínio. Um desafio.
Primeiro: A generalidade dos portugueses comporta-se hoje como se nada de muito grave se passasse em Portugal. Aceitam que o seu governo perca mais tempo a discutir a lei do casamento homossexual, ou a oposição à Lei das Finanças Regionais, do que, por exemplo, a investir em evitar (evitar mesmo) a queda no terrível abismo para que se debruçam as contas nacionais.
Segundo: A generalidade dessas pessoas, cuja influência política no dia-a-dia é nula, convenceu-se de que viver em democracia é sinónimo de votar a cada quatro anos. Isso explica que, de cada vez que é chamada às urnas, olhe para o país como um comboio que não sai da linha mesmo que o maquinista seja mau.
Terceiro: Para piorar tudo isto, as forças políticas da oposição, e a generalidade das elites não alinhadas (que conhecem tão bem como os media aquilo que se passa na carruagem da frente), resolveram justificar todas as suas falhas com a manipulação de que - acusam - os media são alvo. Não é preciso ler Maquiavel para saber que o poder se exerce - e se ocupa.
E que aqueles que o detêm só o largam quando confrontados por um poder maior. O antigo presidente da Câmara de Nova Iorque, o agora célebre Giulliani, combateu as pequenas máfias que aterrorizavam Manhattan dando-lhes a sensação de que morderia com mais força do que elas. Por cá, essas forças aceitam que haja vozes livres que sejam, de um dia para o outro, silenciadas.
Quarto: Se não fosse assim,a impunidade de alguns não seria tão evidente e a disponibilidade política de outros sobressairia em momentos assim. José Sócrates não tem condições para governar muito mais tempo porque ele próprio assim o quer - com todas estas embrulhadas na justiça, geridas com os pés por quem detém informação privilegiada, mais vale ter um plano de fuga sempre à mão.
Quinto: Portugal, com todas estas tristes histórias, corre o risco de ser olhado como uma Grécia, quando pouco nas suas contas permite essa comparação. Não é mérito de Sócrates. É mérito de um país que, nos últimos anos, tem crescido abaixo da média da União Europeia mas nunca alavancou a sua economia em bolhas especulativa, bolsas imobiliárias ou perigosos passivos bancários.
Sexto e último: Um país define-se em momentos de crise. E por aquilo que, como povo, é capaz de fazer. A indiferença popular, e a obstinação das elites em olhar para os alvos errados, não promete nada de bom quando está à vista de todos que o comboio descarrila sem um bom maquinista.

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